quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

A dois passos do precipício...



Fiz de mim liberdade, independência e audácia. Cheia de vontades e certezas, fui me arriscando a cada passo que eu dava. Sempre foi um misto de conquista e angústia, porém, saber que eu conseguiria seguir sem ter que voltar, me dava mais força.
A força e a coragem aumentavam de acordo com os obstáculos conquistados. Morar fora, a primeira viagem dirigindo um carro sozinha, a primeira conta paga sem ter que pedir dinheiro emprestado, o primeiro sono sem ter horas pra acordar ou satisfação para dar do porquê ter dormido nua. Porém... minhas conquistas sempre são burladas por mim mesma. Sim. Consigo sabotar meu sucesso e minhas aventuras e glórias se resumem em depender.
No fim, sempre acabo num quarto, em uma casa de outrem, tendo que viver a rotina do outro, as vontades dos outros e as conquistas alheias. De tantas quedas e quartos mofados alheios, comecei a entender que nunca fiz de mim liberdade e sim sonhadora.
A diferença da mais nova queda, do mais novo fracasso, é que não posso fumar uma carteira de cigarro inteira, ou encher a cara de um conhaque barato, ou simplesmente sair caminhando sem destino e desaparecer por alguns dias. Pois é. Minhas escolhas me fizeram mãe, esposa, funcionária pública e dependente de outrem.
Não digo dependente financeiramente, mas dependente de não ter liberdade de dizer o que quer, como quer. De não poder decidir por si só e simplesmente seguir. E isso, isso foi tudo o que mais refutei na vida.
Hoje, num fracasso mais recente, deitada numa cama que não é minha em um quarto que não é na minha casa, percebi que um laudo médico fez com que muitas pessoas tivessem o “direito” de decidir por mim. Decidir até quando devo ou não ter liberdade de novo ou,  simplesmente, poder escolher o piso que eu quero para meu banheiro.
Entre quartos alheios com minhas coisas jogadas, noto que o outro se incomoda com minha natureza e deseja, profundamente, que eu me adeque a ele... Em quartos alheios com minhas coisas largadas, percebo que tenho que ser uma filha que aceita tudo e grata por ter um lugar pra dormir, mesmo que o que me faça dormir em um lugar que não é meu não seja minha culpa... Percebo aos poucos que a mulher que todos desejam que eu seja não é nem um pouco parecida com o que eu construí pra mim.
Ontem, após mentiras, cobranças e conselhos não pedidos, notei que não sou e nunca serei o que um dia desejei ser. Liberta... 
Ontem, após perceber que para sobreviver aqui eu teria que morrer por dentro, morri...

Obrigada por me abrirem os olhos...